Estava assistindo recentemente meu companheiro de
Martinica, Geraldinho Azevedo, juntamente com Amelinha, no Sarau de Chico
Pinheiro. Eu curtia as músicas tranquilamente quando o compositor me
surpreendeu com uma declaração insólita. Dizendo-se afeto à Bossa Nova, acabou
por declarar que ela não havia nascido no Rio de Janeiro e sim no Vale do São
Francisco porque, afinal, João Gilberto é de Juazeiro. Se a Bossa Nova tivesse,
realmente, nascido no Nordeste, eu nada teria a reclamar porque, além de tudo,
sou filho de nordestino, pois a família do meu pai é toda do Maranhão. Mas é
preciso atentar para os fatos. A Bossa Nova é primeiramente composição, sendo a
interpretação, departamento de João Gilberto posterior pois quem interpreta,
interpreta alguma coisa. Apesar de ser o meu preferido, João Gilberto não é o
primeiro e tão pouco o único intérprete, havendo antes dele e, também com ele,
outros como a primeira intérprete, essa sim, a carioca Sylvia Telles seguida de
Nara Leão, Claudete Soares, Leny Andrade, Alaide Costa, Pery Ribeiro e Os
cariocas. Nara também é anterior, porque em 57, além de Sylvia Telles,
participou do show da Sociedade Hebraica onde surgia por primeira vez a expressão
Bossa Nova. Leve-se em conta, ainda, que os compositores de Bossa Nova da
primeira geração, todos cariocas, eram também os primeiros intérpretes de sua
própria música. Alguém há de comentar que a batida de samba do João seria a
característica principal da Bossa Nova, sem levar em conta que a primeira
gravação do João Gilberto foi Manhã de Carnaval, um samba-canção e entre as
primeira gravações de Sylvia Telles está, entre outras, de 1955, Foi a noite, de Jobim e Mendonça, outro
samba-canção o que corrobora minha
conclusão que Bossa Nova não é apenas samba, mas além de samba-canção é, também,
marcha-rancho, marchinha, baião, toada, valsa, modinha, etc.....
Cabe apenas adicionar que, segundo a visão de
Geraldinho, a música do mineiro João Bosco, por exemplo, teria nascido no Rio Grande do Sul,
porque sua intérprete por excelência, Elis Regina, era gaúcha...
Carlos Lyra,
junho de 2015
Gostei desse texto, notadamente do último parágrafo...
ResponderExcluirQuanto ao restante, a mim parece indiscutível a argumentação desenvolvida e ainda mais poderia ser acrescentado, como os fundamentos do gênero já existentes nas composições e execuções de Johnny Alf. E se formos mergulhar profundamente no tema possivelmente encontraríamos também raízes nas gravações de Dick Farney. Ambos cariocas.